Autismo, de Valério Romão, ilustrações de Alex Gozblau, edição Abysmo.
«São os segredos, sobretudo os mais sombrios, que aproximam as pessoas». A frase é de Rogério, a voz central de «Autismo». Há de facto um segredo sombrio neste romance. Tão sombrio como o mais terrível pesadelo.
O segredo, evidentemente, não reside naquilo que o título nos revela de imediato: o filho de Marta e Rogério nasce autista. Desde cedo se percebe que Henrique não é uma criança como as outras.
A primeira reação dos pais é de negação: «Rogério» - escreve-se a páginas 113 - «tinha uma intuição do nome a dar ao que Henrique tinha, mas tinha medo de dá-lo. Tinha medo de partilhar esse medo com Marta».
A pouco e pouco a evidência ganha forma e começa a corrida de médico em médico, de charlatão em charlatão. Há mesmo um que promete milagres de tal ordem que recebe o cognome de "O Fabuloso Dr. Miguel Relvas". É a fase de descompressão burlesca de uma história marcada pelo insuportável peso da dor.
Valério Romão, o autor, partiu de uma experiência autobiográfica para nos contar como as expectativas de um casal, estilhaçadas pela doença, acabam por corroer a própria relação. «Autismo» é um livro sofrido e ao mesmo tempo, também, um romance capaz de gerar um mistério que só acabamos por ver esclarecido nas últimas páginas. Henrique, o menino autista, foi atropelado. Metade do livro, em capítulos alternados com o que conduziu até àquele momento, passa-se com os pais à porta de uma urgência hospitalar tentando perceber o que aconteceu ao filho.
Descobrimos assim, com estas personagens, como diz a páginas tantas, que «a dor tudo muda, mesmo as convicções mais enquistadas na consciência».
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