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Nuno Júdice vence Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana

Dez anos depois de Sophia de Mello Breyner ter recebido o prémio em 2003.

Nuno Júdice vence Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana :)))

 
O poeta Nuno Júdice foi nesta quinta-feira galardoado com o XXII Prémio Reina Sofia de Poesia Ibero-Americana, atribuído pelo Património Nacional espanhol e pela Universidade de Salamanca, no valor de 42.100 euros.
O prémio reconhece o conjunto da obra poética de um autor vivo que, pelo seu valor literário, constitua uma contribuição relevante para o património cultural partilhado pela comunidade ibero-americana.
O júri considerou o poeta, ensaísta e ficcionista português como autor de uma poesia "muito elaborada, de um classicismo depurado", mas, ao mesmo tempo, com um grande compromisso com a realidade, segundo a agência EFE.
Nesta edição, o júri foi constituído por 18 personalidades ibero-americanas da área da filologia, da literatura e do ensaio literário, entre os quais José Rodriguez-Spiteri Palazuelo, presidente do Património Nacional, Daniel Hernández Ruipérez, reitor da Universidade de Salamanca, José Manuel Blecua Perdices, da Real Academia Espanhola, e Víctor García da la Concha, director do Instituto Cervantes.
À agência Lusa, Nuno Júdice afirmou que o prémio ajudará à projecção da sua obra e sublinhou que evidencia “a importância da poesia portuguesa” no contexto ibero-americano. “Vai dar projecção à minha obra, mas mais importante que isso, mostra que a poesia portuguesa continua a ter um papel importante neste contexto [ibero-americano]”, disse à Lusa o autor, que confessou estar “contentíssimo” com o galardão.
Nuno Júdice, que está publicado em Espanha e em vários países da América Latina, reconheceu que é “razoavelmente conhecido, mas não foi isso que terá contribuído para o prémio”, que foi “uma surpresa quando soube”, na manhã desta quinta-feira. O poeta está a trabalhar num novo livro de poesia, ainda sem título, que “deverá ser editado no final deste ano ou no princípio do próximo”.
Nuno Júdice, de 64 anos, é autor de 30 livros de poesia, entre os quais A Matéria do Poema e Guia dos Conceitos Básicos, editado em 2010. O autor, que começou a publicar poesia em 1972 – A Noção do Poema e O Pavão Sonoro –, tem escrito também obras de ensaio, teatro e ficção. A Dom Quixote publicou, no passado mês de Fevereiro, a novela A Implosão. Além do universo hispânico, Nuno Júdice tem obras traduzidas em Itália, Inglaterra e França.
Nasceu na Mexilhoeira Grande, Algarve, formou-se em Filologia Românica pela Universidade Clássica de Lisboa e é professor associado da Universidade Nova de Lisboa, onde se doutorou em 1989. Entre 1997 e 2004 desempenhou as funções de conselheiro cultural e director do Instituto Camões em Paris. Tem publicado estudos sobre teoria da literatura e literatura portuguesa.Tem livros traduzidos em várias línguas, destacando-se Espanha, onde tem uma antologia na colecção Visor de poesia, e França, onde está publicado na colecção Poésie/Gallimard. Dirigiu até 1999 a revista Tabacaria, da Casa Fernando Pessoa. Em 2009, assumiu a direcção da revista Colóquio/Letras da Fundação Calouste Gulbenkian.
O escritor já foi galardoado com vários prémios literários, nomeadamente o Prémio Pen Clube, em 1985, o Prémio Dom Dinis, em 1990, o Prémio da Associação Portuguesa de Escritores, em 1995, e o Prémio Fernando Namora, em 2004.


Carta (Esboço)

Lembro-me agora que tenho de marcar um
encontro contigo, num sítio em que ambos
nos possamos falar, de facto, sem que nenhuma
das ocorrências da vida venha
interferir no que temos para nos dizer. Muitas
vezes me lembrei de que esse sítio podia
ser, até, um lugar sem nada de especial,
como um canto de café, em frente de um espelho
que poderia servir de pretexto
para reflectir a alma, a impressão da tarde,
o último estertor do dia antes de nos despedirmos,
quando é preciso encontrar uma fórmula que
disfarce o que, afinal, não conseguimos dizer. É
que o amor nem sempre é uma palavra de uso,
aquela que permite a passagem à comunicação ;
mais exacta de dois seres, a não ser que nos fale,
de súbito, o sentido da despedida, e que cada um de nós
leve, consigo, o outro, deixando atrás de si o próprio
ser, como se uma troca de almas fosse possível
neste mundo. Então, é natural que voltes atrás e
me peças: «Vem comigo!», e devo dizer-te que muitas
vezes pensei em fazer isso mesmo, mas era tarde,
isto é, a porta tinha-se fechado até outro
dia, que é aquele que acaba por nunca chegar, e então
as palavras caem no vazio, como se nunca tivessem
sido pensadas. No entanto, ao escrever-te para marcar
um encontro contigo, sei que é irremediável o que temos
para dizer um ao outro: a confissão mais exacta, que
é também a mais absurda, de um sentimento; e, por
trás disso, a certeza de que o mundo há-de ser outro no dia
seguinte, como se o amor, de facto, pudesse mudar as cores
do céu, do mar, da terra, e do próprio dia em que nos vamos
encontrar, que há-de ser um dia azul, de verão, em que
o vento poderá soprar do norte, como se fosse daí
que viessem, nesta altura, as coisas mais precisas,
que são as nossas: o verde das folhas e o amarelo
das pétalas, o vermelho do sol e o branco dos muros.

Nuno Júdice, in “Poesia Reunida”

















Fonte:http://www.publico.pt/cultura/noticia/nuno-judice-vence-premio-rainha-sofia-de-poesia-iberoamericana-1594604

 

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